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Um Lugar Especial

Aproximação aos ecossistemas e contribuição para a sustentabilidade paisagística.

 

A pressão demográfica e a construção civil tornaram urgente este levantamento florístico, tendo em vista um melhor conhecimento das espécies endémicas e subespontâneas que na Vila de Parede há muito encontraram um lar.

Grande parte das herbáceas e lenhosas, aqui representadas, possuem propriedades medicinais, alimentares ou tão-simplesmente estéticas que, se devidamente analisadas e aproveitadas, poderiam contribuir para a melhoria da nossa qualidade de vida e conservação dos ecossistemas, embelezando espaços públicos com a vantagem do baixo custo da sua manutenção.

Em vez de investirmos no seu combate, primeiro deveríamos investir no seu estudo, de forma a torná-las nossas aliadas e não inimigas. Antes de as regarmos com herbicidas - que por si só causam danos irreparáveis na saúde de todos, pessoas e animais - quem sabe se nos reconciliaríamos com o meio ambiente do qual, infelizmente, vivemos cada vez mais afastados. As espécies silvestres endógenas, ao contrário das alógenas e híbridas que enchem os nossos jardins monótonos e dispendiosos, encontram-se totalmente adaptadas ao nosso clima e aos nossos solos, não necessitando de regas frequentes nem da utilização de adubos e pesticidas, uma vez que a Selecção Natural as tornou geneticamente resistentes às vicissitudes do meio no qual evoluíram ou há muito se adaptaram. Além disto, convém lembrar que as suas sementes podem ser obtidas a custo zero e nos próprios locais. Os chamados "jardins de pedras" ou "jardins de sequeiro" - que privilegiam algumas espécies arbóreas como a oliveira, o zambujeiro, a alfarrobeira e a figueira -, podem ser plantados com recurso exclusivo a espécies autóctones silvestres e a materiais como o cascalho, a areia, os seixos e as madeiras, que lhes conferem uma aparência limpa e uma dinâmica original e até inesperada, carregada de simbolismo e de sentimento. Ao observarmos estas espécies no seu estado bravio, depressa nos apercebemos do incrível potencial das suas cores, formas, tamanhos, texturas e perfumes genuínos, bem como da enorme diversidade existente num só local. Seleccionadas de acordo com o efeito pretendido, estas plantas recriam ambientes naturais, feéricos, lugares que povoam a nossa imaginação e nos enchem de ânimo.

As gramíneas, as asteráceas, as fabáceas, as boragináceas, as umbelíferas e as cariofiláceas encontram-se entre as famílias mais interessantes e eficientes na criação destes jardins de sequeiro – que poderíamos apelidar de jardins prístinos –, contribuindo para a sustentabilidade dos recursos hídricos e para a harmonização com a energia telúrica.

Também do ponto de vista da medicina tradicional, há que lembrar que uma espécie afeita a uma região tem maior eficácia no tratamento de doenças sazonais dessa mesma área geográfica. Da mesma forma que não é saudável consumirmos fruta fora de época ou alimentos cultivados num clima muito diferente do nosso, também não devemos buscar longe a cura para os males daqui, isto porque os vírus e as bactérias também sofrem adaptações de acordo com as características dos locais onde proliferam. Os venenos e os seus antídotos tipicamente crescem lado a lado, pelo que é frequente encontrarmos labaças junto a urtigas, e dormideiras em campos de aveia, constituindo sintáxones frequentes. A Natureza nada deixou ao acaso; cabe-nos a nós reaprender-lhe a linguagem e deixarmo-nos cativar pela sua singularidade genial que nos reconduzirá à nossa essência enquanto emanações do espírito da Terra.

Serve o presente herbário para nos reaproximarmos da Natureza que há muito deixámos para trás, mas que nunca nos deixou a nós.

O ser humano sente necessidade de nomear tudo quanto o rodeia. Nomear é criar, é passar da possibilidade à existência concreta. Os nomes aproximam as pessoas umas das outras, fazem com que passem a conhecer-se. Conhecem-se porque são capazes de se nomearem mutuamente. Em relação à Natureza, passa-se o mesmo, quando conhecemos o nome daquela plantinha ali no passeio, a nossa postura tende a altera-se em relação a ela, a planta entra para o nosso «mundo conhecido», torna-se parte da nossa identidade porque participa do mesma esfera que nós, a esfera dos nomes.

Este herbário tem como função nomear os seres vegetais que moram nas nossas vizinhanças, para que aprendamos a respeitá-los e a integrá-los nas nossas vidas, que deles dependem.

 

Sem plantas não seria possível a nossa existência nem a de qualquer outro animal terrestre. Elas foram as pioneiras, desbravadoras de um mundo extra-aquático estéril, rochoso e árido. Colonizaram-no primeiro os líquenes que abriram caminho aos musgos, hepáticas e antocerotas, e estes por sua vez criaram condições ao desenvolvimento das plantas superiores. E a evolução continuou - insectos, anfíbios, répteis, aves e mamíferos até chegar ao Homem.

Hoje lutamos por recuperar um património que nos tem sido negado e ao qual temos direito enquanto seres vivos. Não é necessário criarmos parques naturais afastados daquilo a que chamamos civilização; não é aceitável esperar pelas férias para termos contacto com a Natureza. A Natureza tem de ser aqui e agora, e fazer parte do nosso quotidiano. O mundo natural não é propriedade privada, não pode ser monopolizado nem sonegado; também não se trata de um remédio com contra-indicações que só possa ser tomado mediante prescrição médica e numa dose estritamente controlada.   

Está na altura de olharmos em nosso redor e compreendermos que não somos estranhos à Natureza e que esta não se encontra trancada em recintos longínquos que só possamos visitar se tivermos tempo e dinheiro. Ela está aqui, à nossa porta e nas nossas casas, e mesmo as mais frágeis plantas permanecem como silhares discretos desta construção magnífica que é o nosso mundo, apesar do betão com que a humanidade as tem vindo a cobrir.

Herbário virtual da Vila de Parede
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